Table for one please.

 Photo:  @adenorah

Pra um? Just one? Solita?

Engraçado como cada um tem um jeito de agir. Às vezes eu preciso ficar sozinha, pra pensar. Sendo assim, apenas hoje perto dos 30 anos, consigo entender quando meu pai se despedia de nós dizendo que ia meditar, pouco antes das dez da noite. Como assim meditar? Papai não fazia yoga nem nada, mas assim como papai, hoje em dia também tenho meu tempo “pra meditar” - sem ser na aula de yoga.

Aconteceu nesse sábado. Tirei a manhã para realizar tarefas de casa. Acordei tarde, tomei um brunch e já me coloquei a lavar a roupa, a organizar as coisas, esperando ansiosamente o melhor momento do dia: a soneca depois do almoço. No entanto, ela não foi boa. Tive um pesadelo que me fez acordar no susto, e assim me vi obrigada a ir pra rua, para pensar. Nesse momento avistei uma fila, era inauguração de uma soverteria, pensei: “Por que não?” Eu tinha um fone de ouvido, um celular carregado e tempo, isso era algo que eu tinha de sobra naquele dia.

Em um dia que os termômetros marcavam zero grau, fiquei quase uma hora e meia naquela fila. Confesso que foi uma experiência única, e amei a playlist q escolhi, mas eu realmente estava com a cabeça em outro lugar. A dona da loja ofereceu cookies, aqueles aparatos para aquecer as mãos, inúmeros brindes.. mas o que mais me chamou a atenção é que enquanto eu esperava várias pessoas vieram me perguntar alguma coisa. Uma delas falou: “Eles estão dando coisas de graça?” Eu respondi que não, era apenas inauguração da loja, por isso a fila daquele tamanho. “Loucura” - ela disse, e ao ouvir isso meus pensamentos encontraram um foco. Talvez se estivesse dando algo grátis ela teria entrado na fila? Não sei. Mas sei que muitas vezes fazemos coisas em nossa jornada e as pessoas não compreendem, e não precisam compreender mesmo. As vezes, nem nós compreendemos mas no final tudo parece se alinhar, como a minha espera na fila que culminou na produção desse texto, mas ainda não termina por aqui.

Quando chegou a minha vez na porta, a atendente me perguntou: “Just one?”, assenti. Ela então fez aquela expressão de: “coitada, tá sozinha”. Já não era em tempo de dizer: nascemos assim e morremos assim, o que nos falta é aprender a viver assim - quando preciso. Não foi a primeira vez que isso aconteceu. Na China, quando cheguei em um lugar sozinha tentaram me mandar embora pra casa. Em Cuba, quando me hospedei num resort fiz reserva para jantares todas as noites, os atendentes não disfarçavam a cara de piedade com a qual me olhavam ao perguntar: “Solita?”. Recordo-me que em uma dessas noites o garçom quase sentou na mesa (ele não parava de conversar e aquilo me irritava profundamente). Em alguns lugares estar sozinha parece crime, algo desesperador.

A verdade é que parece que o mundo não está preparado para pessoas assim, que às vezes saem sozinhas porque não se privam de algo. Parece que existe uma certa cobrança a cada segundo para que estejamos sempre com gente, sempre cercados. E isso nos faz esquecer que é possível sim aproveitar a nossa própria companhia. Já me privei uma vez: Ir a um jogo de futebol americano, pois não gosto da idéia de ir a um estádio sozinha e não consegui nenhuma companhia para aquele evento. Eu me sentia arrependida disso até que uma amiga disse: “Que bom que você não foi, ir sozinha nesse caso não é legal”. Ou seja, não dá pra fazer tudo tudo sozinha, ainda bem que algo dentro de nós consegue estabelecer limites para que o auto respeito exista.

Fico tão chateada ao ver amigas se privando de algo só pelo fato de não terem alguém pra ir junto. Há algum tempo deixei isso de lado. Começou com uma ida ao cinema, evoluiu para um café, hoje em dia nada me segura.. de bares à jantares, viagens e passeios: tudo é festa. A distância entre o que eu posso fazer e o arrependimento de não ter ido é muita curta.  Aos seis anos fiz um desenho no dever de casa, a legenda era: menina empurra mala. Hoje eu olho o desenho e o percebo diferente: Menina com amor na mala pois a única bagagem que eu tenho certeza que eu posso dar conta é a minha. Saibamos aproveitar a nossa própria companhia e que isso não nos impeça de conhecer o mundo, com sabedoria e cuidado.



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